Caso Clínico: DISFUNÇÕES E CIRURGIAS A NÍVEL PÉLVICO E SUAS REPERCUSSÕES CLÍNICAS EM OSTEOPATIA

Cicatrizes são provocadas por traumas, cirurgias ou queimaduras. Quando a derme e a fáscia são afetadas por cicatrizes, essas estruturas são alteradas, sua função e capacidade de interação com o ambiente externo e interno tornam-se diminuídas. Atualmente, o panorama científico oferece algumas possibilidades de explicação, mas as de maior aceitação são as hipóteses de inflamação neuroinflamatória ou a neurogênica. Pesquisas confirmaram um aumento de terminações nervosas na região das cicatrizes e um acúmulo de neuropeptídeos, isso significa que uma cicatriz pode desencadear estímulos diários, permitindo entender sua relação com aparecimento de sintomas.

Interdependência regional é o termo que tem sido utilizado para descrever observações clínicas, relacionado a diferentes regiões do corpo, principalmente com distúrbios musculoesqueléticos. Existe uma crescente base literária demonstrando que as intervenções aplicadas a uma região anatômica pode influenciar o resultado e a função de outras regiões do corpo, que aparentemente poderiam não estar relacionadas. Ampliando possíveis hipóteses que possam sustentar conceitos de interdependência regional, destaca-se a teoria da Tensegridade, descrita pela primeira vez pelo arquiteto Buckminster Fuller. O conceito refere-se a estruturas de rede que mecanicamente estabilizam-se através do uso de uma pré-tensão de tração. A Tensegridade é a teoria que amplia a necessidade e interdependencia regional para propagação de forças de mecanotransdução celular, processo pelo qual as células percebem as forças mecânicas e estimulam alterações bioquímicas intracelulares. Baseado nisso, considerando a forma de células nucleadas e de sua estrutura molecular interna, conhecida como citoesqueleto, defende-se que as células vivas usem arquitetura de tensegridade (integridade tensional) para controlar sua forma e estrutura.

 

Mas como uma disfunção ou cirurgia a nível pélvico pode causar sintoma em qualquer região do corpo?

 

ANATOMIA! A Região pélvica é um centro de distribuição de cargas corporais, sofrendo e causando adaptações ascendentes e descendentes.

Na pelve estão localizados os órgãos pélvicos, em especial na mulher, o útero, órgão de extrema importancia para reprodução e que sofre de diversas disfunções fasciais, estando envolvido em muitos casos de sintomas musculoesquléticos. Muitas mulheres sofrem de dores lombares durante o período menstrual, bem como as cefaléias nesse mesmo período, oque indica uma influencia direta do funcionamento do órgão e sua repercussão no sistema, claro que somado a toda função hormonal envolvida.

A cirurgia mais frequente nesta região é a cesárea, que se trata de um procedimento simples para a retirada do feto, mas que é extremamente agressiva para os tecidos locais. Após uma cesárea, por mais que a cicatriz externa seja cada vez mais perfeita, quase imperceptível, o acúmulo de tecido interno é extremamente exagerado, causando tensões fasciais e aderencias que podem repercutir por todo o corpo.

Sabemos que os órgãos pélvicos estão sustentados e conectados por um conjunto de ligamentos que denominamos de fáscia sacroretogenitovesicopúbica, este tecido conectivo envolve desde o púbis, todos os órgãos pélvicos até o sacro, desse modo uma disfunção de qualquer órgão local, ou qualquer tensão proveniente de um procedimento cirúrgico pode gerar disfunções em órgãos vizinhos, na região púbica ou na região sacra.

Esta fáscia tem ligação direta, através do ligamento pubovesical com o sistema suspensor uraco, que é proveniente de um ligamento que parte do fígado, portanto após uma cirurgia cesárea é possível a paciente desenvolver uma dor na região do ombro por conta dessa cadeia ascendente ou, desenvolver uma fasceíte plantar por conta de um bloqueio de ilíaco em rotação.

Pensando no sacro, podemos imaginar a repercussão destas disfunções até o nível craniano, considerando que a dura-máter, meninge mais externa, se insere nessa peça óssea. Partindo deste pensamento podemos explicar cefaleias persistentes com envolvimento de tubo dural com possível início pós-cirúrgico a nível pélvico.

São inúmeras as correlações que podem ser feitas partindo da reigão pélvica, portanto, sempre que a (o) paciente apresentar histórico cirúrgico desta região ou até mesmo indício de disfunção local, vale a pena avaliar!

 

CASO CLÍNICO:

Paciente, sexo feminino, 52 anos, queixa principal de dor pontual nas articulações sacroilíacas e cefaleia persistente há um mês, seu sintoma piora ao mudar da posição sentada para em pé. Histórico de duas cirurgias cesáreas e um procedimento de histerectomia.

Ausculta global evidenciou tensão na região pélvica que foi comprovada por ausculta local.

Paciente apresentou dor à palpação na região tóraco-lombar com bloqueio importante da mesma.

Foi realizadoo teste de Lifting na região de cicatriz e pedido para que a paciente realizasse seu movimento de maior dor (sentada para em pé), o teste foi considerado positivo, pois a mesma não apresentou sintomas ao realizar o movimento.

Como tratamento foi realizado técnica estrutural funcional na região da cicatriz pélvica, seguido de técnicas de liberação fascial de bexiga. Foi realizada ainda técnica articulatória na região tóraco-lombar e técnica para o plexo lombar.

Após as técnicas a paciente relatou grande melhora imediata dos sintomas na região sacroilíaca. Após uma semana a paciente retornou sem queixas de cefaléia e relatou que a melhora da dor articular se manteve em 80%.